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Ciúme Patológico

O ciúme é uma emoção complexa. Pode ser definido como a percepção da ameaça da perda de uma relação valiosa para um rival real ou imaginário. A expressão do ciúme varia da normalidade à doença, com graus diferentes de intensidade, persistência e percepção (insight).

O ciúme patológico é aquele que está baseado em crenças falsas (idéias sobrevaloradas ou delírios) que não são abaladas pela argumentação racional. Ele pode ser um sintoma de um transtorno psiquiátrico, como o alcoolismo, o transtorno obsessivo-compulsivo ou o transtorno delirante.

Diversas escolas de pensamento já procuraram explicar o ciúme. A psicologia evolucionista, por exemplo, descreve o ciúme como uma experiência universal e inata com valores positivos em ambos os sexos. No homem é ligada à importância da certeza da paternidade, enquanto na mulher seria relacionada à necessidade do estabelecimento de relações estáveis e duradouras para a criação adequada das crianças. Estas idéias são apoiadas por alguns estudos que mostram que os homens são mais afetados por idéias envolvendo a possibilidade de infidelidade sexual e as mulheres, por sua vez, são mais preocupadas com a possibilidade de infidelidade emocional.

Estes estudos, entretanto, são contestados por outros que afirmam que o ciúme não é definido apenas por fatores biológicos, mas também por fatores sociais e culturais.

A definição de ciúme patológico deve incluir, sem dúvida, uma suspeita inexplicável relacionada à fidelidade do parceiro que modifica os pensamentos, sentimentos e o comportamento do paciente. A suspeita não é confirmada por qualquer prova real e não só prejudica a vida da pessoa que sofre deste transtorno, mas também afeta o parceiro e o relacionamento. Tentativas para confirmar estas suspeitas são comuns e podem envolver a leitura da correspondência do parceiro, a checagem dos seus trajetos e a contratação de detetives particulares. Freqüentemente, a pessoa enciumada interroga constantemente seu parceiro sobre os eventos que ocorreram em seu dia e sobre os supostos episódios de traição. A evitação de situações que provocam ciúme também é comum. Discussões e acusações também acontecem e podem resultar em violência verbal ou física.

A maior parte das pesquisas disponíveis até o momento envolveu pacientes portadores da variante delirante do ciúme patológico, que envolve delírios de infidelidade e também é conhecida como síndrome de Otelo (uma referência ao personagem Otelo na peça “Otelo, o mouro de Veneza” de William Shakespeare). Até o momento, há poucas informações disponíveis sobre a variante obsessiva do ciúme patológico, em que ocorrem idéias obsessivas de infidelidade e estas idéias são, freqüentemente, ego-distônicas (isto é, são tidas pelos próprios pacientes como absurdas, irracionais ou sem sentido).

Atualmente, sabe-se muito pouco sobre as origens do ciúme patológico. Uma pesquisa realizada em 1994 mostrou que até 30% dos portadores de ciúme patológico podem apresentar lesões do sistema nervoso central, principalmente lesões do hemisfério direito e das áreas frontais do cérebro. Os dados disponíveis até o momento, permitem afirmar que alguns neurotransmissores como a serotonina estão envolvidos.

O cônjuge é freqüentemente a primeira pessoa a procurar ajuda. Devido ao risco de violência, a avaliação do paciente com ciúme patológico deve ser realizada de maneira minuciosa por um psiquiatra. Ele irá caracterizar a intensidade da crença da pessoa com ciúme em relação à infidelidade do parceiro, fatores provocadores de explosões de ressentimento, acusação ou interrogatórios e as reações do paciente e do cônjuge a estes comportamentos.

O tratamento do ciúme patológico pode envolver tanto o uso de medicamentos quanto de psicoterapia (terapia pela fala) ou combinação destas duas abordagens terapêuticas. A variante delirante do ciúme patológico em geral é tratada com antipsicóticos. Para alguns pacientes, pode ser necessária uma internação hospitalar para preservar o cônjuge de episódios de violência e prevenir complicações. A variante obsessiva é tratada de maneira semelhante ao transtorno obsessivo-compulsivo, com o uso de inibidores seletivos de recaptação da serotonina e terapia cognitivo comportamental.

Referências:
Gelder M, Mayou R, Geddes J. Psiquiatria – Segunda Edição. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 1999.

Marazziti D, Nasso ED, Masala I, Baroni S, Abelli M, Mengali F, Mungai F, Rucci P. Normal and obsessional jealousy: a study of a population of young adults. European Psychiatry 2003; 18: 106–111.

Westlake RJ, Weeks SM. Pathological jealousy appearing after cerebrovascular infarction in a 25-year-old woman. Australian and New Zealand Journal of Psychiatry 1999; 33 (1):105-107.

Material elaborado por Antonio Leandro Nascimento e Marco Antonio Alves Brasil.